Uma divertida “polêmica” agitou duas dioceses norte-americanas por ocasião do histórico programa espacial ApolloNo último 20 de julho completou-se mais um aniversário desde que o astronauta norte-americano Neil Armstrong se tornou o primeiro homem a pisar na superfície da lua.
Por ocasião desse aniversário, a jornalista Adelaide Mena, que escreve de Washington para o Our Sunday Visitor (OSV), publicou um curioso texto intitulado “A Igreja tem jurisdição sobre a lua?“.
A reportagem se baseia numa entrevista com o padre Richard Walsh, sacerdote de origem irlandesa recém-ordenado naquela época: em 1968, ele chegou à paróquia de Nosso Salvador, em Cocoa Beach, na Flórida, a poucos quilômetros das plataformas de lançamento do Centro Espacial Kennedy e da estação de Cabo Canaveral.
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Uma paróquia com a cabeça na lua
A chegada do padre Walsh foi pouco antes dos lançamentos da Apollo 9 e da Apollo 10, com voos tripulados que, respectivamente, circundavam a Terra e a Lua. O sacerdote desenvolveu um sólido relacionamento com as equipes terrestres e espaciais das missões Apollo, cujos astronautas visitavam com frequência a casa paroquial. Era o caso de Eugene Cernan, que esteve a bordo da Apollo 10 e da Apollo 17 e foi o décimo primeiro homem a chegar à lua, e de Bill Anders, da Apollo 8, que foi até tomar café-da-manhã na paróquia.
Em junho de 1968, cerca de seis meses antes que a Apollo 8 orbitasse a lua pela primeira vez, foi fundada a diocese de Orlando, que abrange vários condados, incluindo o de Brevard, onde ficam o Cabo Canaveral e o Centro Espacial Kennedy.
Após o pouso na lua, o primeiro bispo da nova diocese, dom William Borders, conhecido pelo bom humor, afirmou ao Beato Papa Paulo VI que o pontífice estava falando com ninguém menos que o “bispo da lua“.
Mas, afinal, quem na Igreja teria jurisdição sobre a lua?
Segundo o Código de Direito Canônico de 1917, que estava em vigor na época, os territórios recém-descobertos ficariam sob a jurisdição da diocese de onde a expedição tivesse partido. No caso da lua, a diocese de partida dos “descobridores” era a de Orlando.
Entretanto, dom Borders não foi o único a “reivindicar” a jurisdição canônica sobre a lua: o então arcebispo de Nova Iorque, dom Terence Cooke, também a “reivindicou” por ser o vigário do Ordinariato Militar – de fato, cabia a ele a jurisdição sobre as bases militares dos Estados Unidos, incluindo a de Cabo Canaveral.
Caso a bem-humorada “polêmica” virasse coisa séria, não haveria grandes dificuldades para solucioná-la: o mesmo Código de 1917 também estabelecia que era o Papa o responsável final pela delegação da jurisdição territorial às dioceses.
Obviamente, para além das divertidas “reivindicações” dos dois bispos, não houve qualquer querela a este respeito, já que a jurisdição no Código de Direito Canônico “não significa nada se não há ninguém sobre quem ter jurisdição“, conforme bem observou o pe. John C. Giel, Chanceler de Assuntos Canônicos da Diocese de Orlando:
“Como ainda não encontramos vida na Lua, a história apenas enfatiza a natureza boa e bem-humorada de dom Border, que lhe permitiu ser um bom primeiro bispo da Flórida Central”.
A “queixa” do padre Walsh
O padre Walsh testemunhou quase todos os lançamentos do programa Apollo, exceto, ironicamente, o da Apollo 11, que foi o que de fato chegou à lua:
“Eu estive presente em quase todos os grandes lançamentos, com exceção do lançamento real da lua”.
É que o sacerdote passou a maior parte do verão de 1969 em Washington, continuando os estudos na Universidade Católica da América. Ele só pôde assistir ao histórico lançamento como a maioria da população: pela TV.
Dando continuidade ao bom humor que parece caracterizar os padres envolvidos com a conquista da lua, ele “se queixa”:
“Fiquei feliz em ver, mas acho que teria ficado muito mais se tivesse estado em Cocoa Beach ou no Centro Espacial Kennedy para o evento real”.