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O Papa Francisco e o aborto na Argentina: é correto acusá-lo de não agir?

Papa Francisco
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Francisco Vêneto - publicado em 29/12/20
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É um fato constatável que a mídia costuma censurar o Papa Francisco quando ele fala contra o abortoO Papa Francisco e o aborto na Argentina: é correto acusá-lo de não agir? Afinal, Francisco tem sido frequentemente acusado de omissão diante da mais recente campanha pró-aborto em seu país natal.

Um fato facilmente constatável é que a mídia costuma censurar o Papa Francisco quando ele fala contra o aborto, conforme foi ressaltado neste mês pelo vaticanista italiano Sandro Magister. Em seu blog Settimo Cielo, Magister observou que, quando o Papa fala em aborto, os grandes meios de comunicação costumam omitir a notícia ou dar-lhe o mínimo possível de visibilidade. Isso tem valido especialmente no caso do ativismo pró-aborto do governo argentino.

Em 14 de dezembro, Magister escreveu:

“Cada vez que toca esse tema, Francisco não desfruta de forma alguma de boa imprensa. Além disso, é sistematicamente ignorado”.

O Papa, no entanto, volta ao tema com frequência e com clareza. No recente livro “Sonhemos Juntos”, por exemplo, ele declara:

“Não posso ficar calado sobre os mais de 30-40 milhões de nascituros que, segundo os dados da Organização Mundial de Saúde, são descartados todos os anos por meio do aborto. É terrível constatar que, em muitas regiões consideradas desenvolvidas, essa prática é frequentemente incentivada porque os filhos que vão nascer são deficientes ou não foram planejados. Mas a vida humana nunca é um fardo. É preciso dar-lhe espaço e não descartá-la. O aborto é uma grave injustiça. Nunca pode ser uma expressão legítima de autonomia e poder. Se a nossa autonomia exige a morte de outros, então a nossa autonomia nada mais é do que uma jaula de ferro. Costumo me fazer duas perguntas: é justo eliminar uma vida humana para resolver um problema? E é justo contratar um assassino de aluguel para resolver um problema?”.

Como se esta posição não fosse explícita e suficientemente clara, Francisco ainda recorda que se trata da postura firme do Magistério:

“Meu predecessor, São Paulo VI, advertia em sua carta encíclica de 1968, Humanae vitae, sobre a tentação de considerar a vida humana como um objeto entre muitos, sobre o qual os poderosos e as pessoas instruídas podem exercer o seu domínio. Como é profética a sua mensagem agora! Hoje, o diagnóstico pré-natal é rotineiramente utilizado para filtrar aqueles que são considerados fracos ou inferiores”.

O Papa Francisco e o aborto na Argentina

E por que Francisco não se pronuncia especificamente sobre o caso da Argentina?

Como arcebispo de Buenos Aires, o então cardeal Bergoglio se manifestava sobre todos os assuntos relevantes do seu país que exigissem posicionamento específico da Igreja ou dele pessoalmente. Agora, porém, ele não é mais o arcebispo de Buenos Aires, mas o Papa de todos os católicos. Como Papa, Francisco se posiciona sobre os assuntos relevantes da humanidade inteira, evitando acirrar conflitos com governos nacionais que facilmente seriam interpretados a partir de perspectivas ideológicas e politiqueiras, principalmente pela mídia ávida por sensacionalismo.

O Papa Pio XII, diga-se de passagem, é até hoje injustamente acusado de inação e covardia em relação ao regime nazista de Adolf Hitler, apesar de todas as provas gritantes de que agiu intensamente para salvar indivíduos, famílias e grupos inteiros de judeus. Farta documentação a respeito pode ser consultada AQUI.

As narrativas desonestas sobre Pio XII não são muito diferentes de certas versões ideologicamente enviesadas sobre Francisco. Aliás, quando foi eleito Papa, ele chegou a ser fortemente criticado por ativistas e autodeclarados jornalistas que, manipulando informações, o acusavam de ter cooperado com a ditadura militar no país. Esta mentira gerou boa audiência para a mídia caça-níquel, mas foi desmentida por pesquisas e testemunhas sérias, entre as quais até um ganhador do Prêmio Nobel da Paz. Pouco depois, e sem o menor pudor, a mesma mídia militante passou a apresentar o novo Papa como uma espécie de garoto-propaganda da esquerda latino-americana, amparando-se nas iniciativas de Francisco em prol dos mais necessitados. Intermitentemente, essa mesma mídia ativista tem selecionado palavras e obras do Papa Francisco de acordo com a sua conveniência ideológica, de modo a divulgá-las ou omiti-las propositalmente com base em critérios enviesados. Isto sem falar nas escancaradas manipulações da imagem do Papa e de suas falas, tirando-as completamente de contexto a ponto de as usarem, por exemplo, até para alegar que ele estaria incentivando o aborto. Foi o caso deste episódio:



Leia também:
DENÚNCIA: Campanha no Brasil manipula o Papa Francisco para promover o aborto

Ainda no tocante à relação entre o Papa e seu país natal, o mesmo Sandro Magister escreve:

“O Papa quer demostrar que se preocupa em ir até o fundo das questões e em falar diretamente ao mundo, sem se envolver na luta política, especialmente na política argentina. Em particular, para Bergoglio, é urgente evidenciar o seu duplo distanciamento: da ex-presidente peronista Cristina Fernandez de Kirchner, com quem diz que ‘não tem nenhum contato’ desde que deixou o cargo, e de Juan Grabois, organizador de primeiro nível dos ‘movimentos populares’ tão amados pelo Papa e a quem ele nomeou assessor do dicastério vaticano para o serviço do desenvolvimento humano integral. A razão desse distanciamento é que tanto uma quanto o outro nos fazem crer que são mais próximos do Papa e mais amigos dele do que realmente são”.

O resultado disto, como ressalta o vaticanista, é o mesmo que o próprio Papa descreveu há poucos dias:

“Os meios de comunicação acabam atribuindo a mim, Francisco, não ‘o que digo’, mas ‘o que dizem que digo’”.

Por outro lado, Francisco tem se manifestado frequentemente contra o aborto e a favor da vida junto à população argentina, mediante iniciativas diretamente voltadas a pessoas que defendem o nascituro. São exemplos recentes duas cartas abertas que ele enviou e que, obviamente, a grande mídia procurou noticiar o mínimo possível:

  • uma, para mulheres da periferia de Buenos Aires que estavam preocupadas com a possível legalização do aborto (confira a respeito no artigo recomendado ao final desta matéria);
  • a outra, em 1º de dezembro, a um grupo de ex-alunos argentinos.

Basicamente: grande parte da assim chamada “grande mídia” censura o Papa Francisco em certos assuntos e o utiliza em outros, conforme conveniências ideológicas que nada têm a ver com jornalismo.

Aparentemente, uma parcela de católicos escolheu fazer o mesmo.


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