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Cristãos brancos escravizados na África: muito mais numerosos do que se acreditava até hoje

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Aleteia Brasil - publicado em 14/12/15
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Novas pesquisas destacam que a escravidão invisível dos europeus cristãos precisa de mais atenção dos estudiososRobert Davis, professor de História da Ohio State University, desenvolveu em seu novo livro uma metodologia única para calcular o número de cristãos brancos que foram escravizados ao longo da Costa Berbere africana, chegando a uma estimativa da população de escravos muito maior que qualquer estudo anterior.

A maioria dos outros estudos sobre a escravidão ao longo da Costa Berbere não focou em estimar o número de escravos ou considerou somente o número de escravos em cidades particulares, observa Davis. Muitas estimativas escravagistas anteriores chegavam por isso a milhares, no máximo a dezenas de milhares de escravos. Davis, no entanto, calculou o número entre 1 e 1,25 milhão de cristãos europeus capturados e forçados a trabalhar no norte da África do século XVI ao XVIII. As novas estimativas de Davis aparecem no livro “Christian Slaves, Muslim Masters: White Slavery in the Mediterranean, the Barbary Coast, and Italy, 1500 – 1800” (Palgrave Macmillan).

“Muito do que foi escrito dá a impressão de que não existiam escravos numerosos e minimiza o impacto da escravidão na Europa”, disse Davis. “Eles olham somente para a escravidão num lugar, ou só durante um curto período de tempo, mas quando você amplia e alonga a visão, a escravidão massiva e seu poderoso impacto se tornam claros”.

É relevante comparar esse tráfico mediterrâneo com o comércio de escravos negros africanos no Atlântico. Ao longo de quatro séculos, o comércio de escravos no Atlântico foi muito maior – cerca de 10 a 12 milhões de negros africanos foram trazidos para as Américas. Mas de 1500 a 1650, quando o escravagismo transatlântico estava ainda na infância, mais escravos brancos e cristãos provavelmente foram capturados para a Costa Berbere do que escravos negros africanos para as Américas, segundo Davis.

“Uma das coisas que tanto o público quanto muitos estudiosos têm em comum é pensar sempre na escravidão como racial por natureza: que só negros foram escravos. Mas isso não é verdade”, declara o pesquisador. “Não podemos pensar na escravidão como algo que somente os brancos fizeram contra os negros”.

Durante o período de tempo estudado por Davis, a religião e a etnia determinavam tanto quanto a raça quem se tornaria escravo. “A escravidão era uma possibilidade bem real para qualquer viajante do Mediterrâneo ou que vivia ao longo das praias da Itália, França, Espanha e Portugal, e até mesmo do norte da Europa, como na Inglaterra e na Islândia”.

Piratas de cidades ao longo da Costa Berbere, no norte da África, como Túnis e Argel, abordariam navios no Mediterrâneo e no Atlântico assim como invadiriam vilas costeiras para capturar homens, mulheres e crianças. O impacto desses ataques foi devastador: França, Inglaterra e Espanha perderam, cada uma, milhares de navios, e longas faixas da costa italiana e espanhola foram quase completamente abandonadas por seus habitantes. No seu apogeu, a destruição e o despovoamento de algumas áreas provavelmente excedeu o que os escravagistas europeus provocariam posteriormente no interior africano.

Embora centenas de milhares de escravos cristãos tenham sido capturados de países mediterrâneos, Davis notou que os efeitos das incursões escravagistas muçulmanas foram sentidos muito mais longe: ao que parece, por exemplo, durante a maior parte do século XVII, os ingleses perdiam pelo menos 400 marinheiros por ano para os traficantes de escravos da África.

Nem mesmo a América ficou imune. Um traficante americano reportou que 130 outros marinheiros tinham sido escravizados pelos argelinos no Mediterrâneo e no Atlântico somente entre 1785 e 1793.

Davis disse que o vasto alcance da escravidão no norte da África foi ignorado e minimizado, em parte porque não há nenhuma agenda para discutir o que aconteceu.

A escravização de europeus não se encaixa no tema geral da conquista do mundo e do colonialismo pela Europa, que é central para os estudos no início da era moderna, disse ele. Muitos dos países que foram vítimas de escravidão, como a França e a Espanha, viriam a conquistar e colonizar as áreas do Norte de África, onde seus cidadãos tinham sido anteriormente detidos como escravos. Talvez por causa dessa história, os estudiosos ocidentais pensaram primeiramente nos europeus como os “colonizadores maus” e não como vítimas da escravidão, coisa que eles também foram, considera Davis.

Segundo ele, outra razão pela qual a escravidão no Mediterrâneo tem sido ignorada ou minimizada é que não há boas estimativas do número total de pessoas escravizadas. Os homens da época – tanto os europeus quanto os donos de escravos no norte da África – não deixaram números detalhados e confiáveis. Em contraste, existem muitas fontes que documentam o número de africanos trazidos como escravos para as Américas.

Davis desenvolveu então uma nova metodologia para estimar de forma razoável o número de escravos na Costa Berbere. Ele pesquisou, primeiro, as melhores fontes disponíveis que indicassem quantos escravos havia em determinada localização e período de tempo. Depois, estimou quantos novos escravos deveriam ser capturados para substituir os escravos que morriam, fugiam ou eram resgatados.

“A única maneira de encontrar números concretos era virar o problema inteiro de cabeça para baixo: descobrir quantos escravos eles teriam de capturar para manter certo nível. Não é a melhor maneira de fazer estimativas da população, mas é a única no caso dos limitados registros disponíveis”.

Juntando essas fontes, como mortes, fugas, resgates e conversões, Davis calculou que cerca de um quarto dos escravos teria de ser substituído todos os anos para manter essa população estável, como aparentemente ela foi entre 1580 e 1680. Isto significava que cerca de 8.500 novos escravos teriam de ser capturados por ano, sugerindo, no geral, quase um milhão de escravos capturados durante o período. Utilizando a mesma metodologia, Davis estimou 475.000 escravos adicionais que foram capturados nos séculos anteriores e seguintes.

O resultado é que, entre 1530 e 1780, quase certamente 1 milhão e possivelmente 1,25 milhão de europeus, brancos e cristãos, foram escravizados pelos muçulmanos da Costa Berbere.

Davis declarou que a sua pesquisa sobre o tratamento desses escravos sugere que, para a maioria deles, a vida era tão difícil quanto a dos escravos nas Américas. “Na campo das condições de vida diárias, os escravos do Mediterrâneo certamente não tinham condições melhores”.

Enquanto escravos africanos faziam um trabalho extenuante nas plantações de açúcar e algodão nas Américas, os escravos cristãos europeus muitas vezes trabalhavam tão dura e letalmente quanto eles – em pedreiras, na construção pesada e, sobretudo, nas galés dos próprios navios corsários.

Davis declara que essa escravidão invisível dos europeus cristãos precisa de mais atenção dos estudiosos.

“Nós perdemos o senso de como a escravidão foi um grande problema para aqueles que viveram no Mediterrâneo. Escravos são escravos, sejam negros ou brancos, estejam sofrendo na América ou no Norte da África”.

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A partir de matéria disponível em Research News, mediante livre tradução do blog Castelo Histórico

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