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“Estou indo para o céu. Vou te ajudar de lá”

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Paola Belletti - publicado em 21/06/17
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As últimas palavras de uma das vítimas do incêndio em um prédio de Londres para sua mãe Gloria Trevisan é linda! Uma jovem belíssima e normal. Marco, seu namorado, também é muito bonito. Parecem felizes. Estão ali, com seus belos rostos estampados em seus perfis nas redes sociais – e agora também nas páginas dos principais meios de comunicação.

Eles aparecem na lista de desaparecidos do prédio que pegou fogo em Londres. Mas, segundo o advogado da família, não há motivos para acreditar que eles continuem vivos.

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Pamela Pizziolo | Facebook | Fair Use

Eu não cheguei a confirmar se Marco ligou para seus pais, se eles também tiveram essa terrível graça de poder acompanhá-lo até o extremo da vida. Os pais de Glória, que moram na Itália, puderam fazer isso porque ela telefonou para eles algumas vezes. Tarde da noite eles ficaram sabendo o que tinha acontecido no condomínio velho de 27 andares, onde os jovens moravam.

Depois que fui mãe (há 13 anos), descobri o que são as fortes cordas que unem os filhos às nossas vidas. Para sempre. Gloria, sem mãe, seria órfã; a mãe e o pai dela, sem ela, serão sempre pai e mãe de Gloria.

Como eles viveram as horas, os minutos, entre uma chamada e outra?

Estou impactada com a valentia desses pais. Como a permanência deles ali, naquele lugar angustiante, dando força um ao outro, e esperando sempre. E aproximando-se cada vez mais da filha, apesar da distância física que os separava. Foram muitos “e se”, vários metros de “te sinto” e “sentirei saudade, mas vá e seja feliz”. “Te apoiamos daqui”.

Sinto alívio ao ver estes sentimentos narrados, por saber destas provas enfrentadas com forças heroicas por esses pais. Teriam eles chegado no fundo de suas reservas? Aonde se chega nestes casos? À medula? Às vísceras? Ao coração, que como órgão vital deve ter sofrido um choque, mas se manteve vivo?

Penso somente nas coisas bonitas que Gloria disse para sua mãe. As poucas, as únicas coisas para serem ditas. Obrigada. Estou indo. Morro, mas vou viver. Eu te ajudarei do céu.

Quem sabe que fé tinha esta moça? Quem sabe o quão cuidadoso foi o anjo da guarda dela naquele momento, e o quanto ele deve tê-la consolado? Quem sabe a surpresa quando ela viu o rosto dele? Como escreve Eugenio Corti em El Caballo Rojo: “Esteban morre, enquanto morre, tudo volta ao revés e ele o vê. Vê, magnífico, seu anjo”.

Se Gloria disse “estou indo para o Céu” em um momento desses, trágico, definitivo e com essa presença de espírito, parece-me que ela tenha intuído ou chegou a crer que estava morrendo.

Não é a frase que encontramos nos comentários do Facebook, alternada com o R.I.P.. Não é o desejo, às vezes infantil, que encontramos por aí. Longe da dor e da morte, isso se torna absurdo para nós, povo cansado, que já se esqueceu de Cristo e sua Redenção. Não. Se ela disse isso naquele momento, ela sabia o que estava dizendo.

Como sabemos nascer quando bebês (nós nos viramos para passar os ombros, abaixamos a cabeça para sair pelo canal do parto, empurramo-nos para fora, para a luz), assim, da mesma misteriosa maneira, todos nós deveríamos saber morrer. Que graça teve Gloria por ter se preparado para o momento mais importante de sua vida.

A hora da morte estava se aproximando e ela sabia. Juntamente com seu namorado que, até que pode, a tranquilizou, se tranquilizou e tranquilizou seus futuros sogros. Mas a fumaça de um incêndio é aterrorizante.

Isso já aconteceu comigo, com meu marido e minha primogênita (eu estava grávida). Fomos acordados no meio da noite com os gritos de um vizinho que tocou a campainha (Deus o abençoe sempre). Nós nos levantamos, saímos correndo, respirando com dificuldade, tossindo, com os olhos lacrimejando, sem ver as paredes e lutando para chegar até as escadas, pensando somente em respirar ar fresco e puro, com o coração batendo na cabeça. Mas o nosso caso foi algo insignificante, comparado a esta tragédia.

Por isso é importante estarmos prontos, vigilantes, presentes.

A Ave-Maria nos une em um só ponto: nunc et in hora mortis nostrae. Gloria estava na sua hora e, com a fumaça asfixiante que encheu seu apartamento, a sua hora se tornou aquela hora, a hora de sua própria morte.

A família Gottardi afirma que até que provem o contrário, continuarão esperando que o rapaz esteja vivo. E também a moça. Claro, cabe esperar. Desejo que possam voltar a abraçá-los ou que possam recuperar os restos mortais. Não ter nem sequer o corpo do filho morto – se seus nomes passarem da lista de desaparecidos para a das vítimas – é uma enorme dor.

De longe, imagino a dor, o desespero destes pais, a vontade que eles têm de acusar neste momento todo um país que está cheio de culpas, que é covarde, que esmaga os jovens, mortifica as famílias, as mães, os pais, os filhos…

Eu entendo perfeitamente. A filha deles, bela, inteligente e tenaz estava lá, longe deles, depois de uma licenciatura, cheia de vida e projetos. Estava lá para poder trabalhar dignamente e ganhar o dinheiro que poderia ganhar perto dos pais. Que raiva!

No entanto, eles deverão se render ao fato de que isso, embora seja uma injustiça social, não basta para explicar o fim da vida de Gloria.

Espero que eles tenham criado e educado Gloria na certeza do Céu, na segurança de que nascemos para viver na alegria, serenidade e satisfação de construir algo bonito e, sobretudo, para amar e sermos amados. Mas também que nascemos para morrer e morremos para viver para sempre.

Espero que eles possam lembrar, agora que tudo parece inútil, que a felicidade existe e, com a graça de Deus, entraremos em seu Reino e ali sabemos que nenhum incêndio o destruirá. Nenhuma fumaça tirará a nossa respiração. Nenhum país nos afundará.

A última chamada de Gloria para sua mãe foi às 4 horas. Segundo o que foi publicado pelo Corriere, a moça disse: “Mamãe, estou morrendo. Obrigado por tudo o que você fez por mim”. Depois, o adeus: “Estou indo para o céu. Eu te ajudarei de lá”.

Como sempre fazem os filhos, ela pediu ajuda aos pais, apesar da evidente impotência deles. O que eles poderiam fazer da Itália? Eles foram submetidos a uma dor e um estresse enormes. Queriam estar com ela. E ela, pobre moça, a quem poderia recorrer se não a quem lhe trouxe ao mundo e a amou?

E, no fim, com sempre fazem os filhos encurralados, disse o essencial: obrigada. Estou indo. Vou ajudá-los.

Se as chamas a levaram, esperamos que tenham também queimado os pecados que ela possa ter cometido. Esperamos que ela tenha pensado: “Maria, ainda preciso de minha mãe. A senhora está aí?”

E sabemos que Maria Santíssima, a bela moça de Nazaré, tem uma certa experiência em acudir a humanidade inteira com o seu “sim”.

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