Como cristãos não podemos permanecer indiferentes diante do drama das velhas e novas pobrezasO Papa Francisco voltou a recordar hoje, Dia Mundial do Migrante e do Refugiado, que não se pode separar o mandamento do “amar a Deus” do “amar o próximo”.
Amar o próximo, entre outras coisas, “significa sentir compaixão pelo sofrimento dos irmãos e irmãs, aproximar-se, tocar as suas feridas, partilhar as suas histórias, para manifestar concretamente a ternura de Deus para com eles”, ressaltou o Pontífice.
Francisco começou sua homilia da Missa celebrada na Praça de São Pedro referindo-se ao Salmo responsorial, que recorda que “o Senhor defende os estrangeiros, juntamente com as viúvas e os órfãos do povo”, com o salmista fazendo “explícita menção daquelas categorias que são particularmente vulneráveis, frequentemente esquecidas e expostas a abusos.
Os estrangeiros, as viúvas e os órfãos são os que não têm direitos, os excluídos, os marginalizados, pelos quais o Senhor tem uma especial solicitude. Por isso, Deus pede aos Israelitas que tenham para com eles uma atenção especial”.
“Os estrangeiros, as viúvas e os órfãos são os que não têm direitos, os excluídos, os marginalizados, pelos quais o Senhor tem uma especial solicitude.”
O Papa recorda que também nos Livro do Êxodo o Senhor “adverte o povo que não maltrate de nenhuma forma as viúvas e os órfãos, porque Ele escuta o seu clamor”, sendo esta advertência retomada também no Livro do Deuteronômio:
Esta preocupação amorosa para com os menos privilegiados é apresentada como um traço distintivo do Deus de Israel, e é também exigida, como um dever moral, a todos quantos querem pertencer ao seu povo. Eis a razão pela qual devemos ter uma atenção especial para com os estrangeiros, como também pelas viúvas, os órfãos e todos os descartados dos nossos dias.
Na Mensagem do Santo Padre divulgada em maio para este 105º Dia Mundial do Migrante e do Refugiado é repetido como um refrão o tema: “Não se trata apenas de migrantes”. E é verdade, sublinha o Papa, que explica:
Não se trata apenas de estrangeiros, trata-se de todos os habitantes das periferias existenciais que, juntamente com os migrantes e os refugiados, são vítimas da cultura do descarte. O Senhor pede-nos que ponhamos em prática a caridade para com eles; pede-nos que restauremos a sua humanidade, juntamente com a nossa, sem excluir ninguém, sem deixar ninguém de fora.
Injustiças
Mas junto com a caridade diz o Papa, “o Senhor pede-nos que reflitamos sobre as injustiças que geram exclusão, em particular sobre os privilégios de uns poucos que, para se manterem, resultam em detrimento de muitos”, recordando que “os países em vias de desenvolvimento continuam a ser depauperados dos seus melhores recursos naturais e humanos em benefício de poucos mercados privilegiados”. E acrescenta:
As guerras abatem-se apenas sobre algumas regiões do mundo, enquanto as armas para as fazer são produzidas e vendidas noutras regiões, que depois não querem ocupar-se dos refugiados causados por tais conflitos. Quem sofre as consequências são sempre os pequenos, os pobres, os mais vulneráveis, a quem se impede de sentar-se à mesa deixando-lhe as “migalhas” do banquete.
É neste sentido que se compreendem as duras palavras do profeta Amós proclamadas na primeira Leitura (6,1.4-7). Ai dos despreocupados e dos que vivem comodamente em Sião, que não se preocupam com a ruína do povo de Deus, visível aos olhos de todos. Eles não se apercebem do colapso de Israel, pois estão demasiado ocupados a garantir uma boa vida, comidas deliciosas e bebidas refinadas.
“É impressionante – disse o Papa, após referir-se às palavras do Profeta Amós da primeira leitura – como à distância de 28 séculos, estas advertências conservam intacta a sua atualidade. Também hoje, na verdade, ‘a cultura do bem-estar […] nos leva a pensar em nós mesmos, torna-nos insensíveis aos gritos dos outros, […] leva à indiferença a respeito dos outros; antes, leva à globalização da indiferença’.”
Indiferença
Assim, “corremos o risco de nos tornarmos, também nós, como aquele homem rico de que nos fala o Evangelho”, pois “demasiado ocupados a preservar o nosso bem-estar, corremos o risco de não nos darmos conta do irmão e da irmã em dificuldade”:
Contudo, como cristãos não podemos permanecer indiferentes diante do drama das velhas e novas pobrezas, das solidões mais sombrias, do desprezo e da discriminação de quem não pertence ao “nosso” grupo. Não podemos permanecer insensíveis, com o coração anestesiado, diante da miséria de tantos inocentes. Não podemos não chorar. Não podemos não reagir.
E se quisermos ser homens e mulheres de Deus como pede São Paulo a Timóteo, devemos «guardar o mandamento […] sem mancha e acima de toda a censura» (1Tm 6,14)”:
E o mandamento é amar a Deus e amar o próximo. Não se podem separar! E amar o próximo como a nós mesmos quer dizer também comprometer-se seriamente pela construção de um mundo mais justo, onde todos tenham acesso aos bens da terra, onde todos tenham a possibilidade de se realizar como pessoas e como famílias, onde a todos sejam garantidos os direitos fundamentais e a dignidade. E o mandamento é amar a Deus e amar o próximo. Não se podem separar!
“Amar o próximo – explicou o Papa – significa sentir compaixão pelo sofrimento dos irmãos e irmãs, aproximar-se, tocar as suas feridas, partilhar as suas histórias, para manifestar concretamente a ternura de Deus para com eles. Significa fazer-se próximo de todos os viajantes maltratados e abandonados pelas estradas do mundo, para aliviar os seus ferimentos e os conduzir ao local de hospedagem mais próximo, onde se possa dar resposta às suas necessidades”.
E este santo mandamento – disse Francisco quase ao concluir – “foi dado por Deus ao seu povo, e foi selado com o sangue do seu Filho Jesus, para que seja fonte de bênção para toda a humanidade. Para que juntos possamos empenhar-nos na construção da família humana segundo o projeto originário, revelado em Jesus Cristo: todos irmãos, filhos do único Pai.”
“Confiamos hoje ao amor materno de Maria, Nossa Senhora da Estrada, os migrantes e os refugiados, juntamente com os habitantes das periferias do mundo e quantos se fazem seus companheiros de viagem.”