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Grandes e discretos sinais do Deus que vem a nós

A Sagrada Família
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Francisco Borba Ribeiro Neto - publicado em 25/12/22
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Essa discrição de Deus, esse respeito a nossa liberdade, permanece surpreendente e até escandalosa mesmo em nossos dias

Uma das leituras mais características do período do Advento é a do Livro de Isaias (7, 10-14), na qual o profeta anuncia ao Rei Acaz que uma virgem dará a luz a um filho. Independentemente de qualquer consideração teológica, o texto é uma interessante parábola sobre a dinâmica da fé em nossa sociedade.

Uma presença discreta

Deus, nas palavras de Isaias, oferece um sinal ao rei. Mais: oferece qualquer sinal que venha a ser pedido, “quer provenha da profundeza da terra, quer venha das alturas do céu”. Acaz, porém, recorrendo a uma falsa humildade, recusa-se a fazer o pedido, alegando não querer “tentar ao Senhor”. Nesse contexto, Deus anuncia que fará um sinal tão maravilhoso quanto paradoxal: “uma virgem conceberá e dará à luz um filho”. Trata-se de um sinal maravilhoso porque nenhuma mulher pode gerar sem a relação com um homem; mas também é paradoxal, pois é praticamente imperceptível. Quem poderá garantir que essa mãe era realmente virgem?

Esse tipo de paradoxo acompanha o cristianismo também em outro sinal maravilhoso: a ressurreição de Cristo. Ela não acontece num momento público, como aquela de Lázaro (cf. Jo 11, 28-45), mas no isolamento da madrugada, quando não há testemunhas. Pior ainda, o Ressuscitado não permanece entre os vivos, como prova cabal de seu retorno. Afinal, quem não acreditaria se até hoje Cristo estivesse pessoalmente entre nós, sentado num trono em Roma ou Jerusalém?

Igualmente, seria muito mais fácil acreditar na historicidade dos Evangelhos se o Senhor onipotente tivesse escolhido nascer no século XIX ou XX, quando os meios de comunicação não deixam de registrar a existência de qualquer líder relevante. Com certeza, o homem que fazia milagres em Jerusalém seria amplamente reconhecido se praticasse seus feitos numa grande metrópole do mundo globalizado e não em obscuros vilarejos da periferia do Império Romano.

Amar em liberdade, não por subserviência

Deus vem ao mundo, mas insiste em não se evidenciar. Em seu amor por nossa liberdade, não procura se impor de um modo incontestável, nos dá a possibilidade de negá-Lo, de não reconhecer Sua existência. Um Deus presente o tempo todo entre os seres humanos seria obrigatoriamente temido e reverenciado, ninguém se atreveria a ir contra este Senhor evidentemente onipotente. O amor se misturaria ao temor, o respeito à subserviência – nós mesmos não saberíamos exatamente como definir nossos sentimentos e nossa relação com Ele.

Essa discrição de Deus, esse respeito a nossa liberdade, permanece surpreendente e até escandalosa mesmo em nossos dias. O ideal da Cristandade, de um mundo onde o poder temporal estivesse subordinado ao poder espiritual dos cristãos, não deixa de ser uma outra forma de buscar esse absolutismo de Deus que cancelaria a possibilidade de não O seguirmos e obedecermos.

Diante dos cancelamentos culturais e das perseguições, muitas vezes almejamos um poder político que obrigasse as pessoas a tornarem-se cristãs ou, pelo menos, obedecerem a um código de conduta ditado pelos valores cristãos. Mas, se Deus quisesse uma obediência compulsória, teria agido de outra forma no mundo. Não quer dizer que Ele não queira nosso amor, nossa virtude e nosso seguimento – mas não deseja que nos relacionemos com Ele por medo ou subserviência.

Por difícil que seja para nós, basta olhar a história de Cristo para constatar que não foi desse modo que Ele agiu.

Aceitar a sutileza do sinal

Por outro lado, muitas vezes agimos como um moderno Acaz, que não quer pedir sinais a Deus para não ter de se converter, ou deixamos de dar o passo de fé absolutamente necessário para descobrir os Seus sinais na história.

A fé não deve ser cega, como algumas vezes imaginamos. Cremos porque encontramos sinais que nos abriram os olhos para a existência de Deus (cf. Catecismo da Igreja Católica, CIC 156-160). Mas esses sinais nunca irão se sobrepor a nossa liberdade, nunca seremos totalmente obrigados a crer. Aquele que pede a Deus um sinal que se sobreponha à sua própria liberdade ficará irremediavelmente frustrado.

Todos nós, que cremos, tivemos momentos em que os sinais pareceram tão evidentes que pensamos “agora, não me é possível deixar de acreditar”. Esses sinais, contudo, sempre vieram em meio a uma história, na qual tivemos a chance de negá-los. Se não tivéssemos, ainda que de forma pouco consciente, aceitado comprometer nossa liberdade, Deus não teria se imposto a nós. Ele nunca deixa de nos chamar, de esperar por nós, mas nunca se impõem autoritariamente.

Se não compreendemos essa ternura de Deus por nós, permanecemos escandalizados com o mal, o sofrimento e a dor. Parece-nos que Ele não existe ou, se existe, não se incomoda conosco. Se não acreditamos, não O encontramos e, se acreditamos, temos dificuldade em anunciá-Lo a nossos irmãos.

O Natal é tempo de, mais uma vez, nos fascinarmos com a ternura dessa presença discreta do Onipotente em nossa vida.

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